quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Noite

A noite na cidade proporciona uma assimilação diferente da realidade que nos cerca. Nossos sentidos parecem cercados por uma atmosfera nebulosa, uma sombra constante que incita a dúvida e transforma a percepção em fonte de serenidade e questionamentos.
Parece paradoxal dizer isso, mas estes são processos paralelos desencadeados pelo ambiente noturno.

A claridade do dia parece nos passar algum tipo de certeza, e nossa experiência aparenta dinâmica. A noite, por sua vez, é algo difuso mas também tranquilizador. É um mar de incertezas, mas que nos assegura a essência de nossos sentidos. Basta observar calmamente pela janela durante uma madrugada, para constatar que a escuridão repleta de luzes artificiais tem cheiro, coisa que o dia não tem. Um cheiro fresco e agradável, seja em uma noite de verão ou em uma noite de inverno.

O encontro do rosto com o ar úmido liberta e embebeda, de forma que planamos pela existência e fugimos da materialidade que nos cerca.

A noite na cidade demonstra aquele que é o princípio da existência: o fluxo contínuo de processos. Processos que exalam vida, questionamentos, sofrimento e prazer.

O ambiente noturno cosmopolita proporciona a descoberta da essência de cada um através da experiência que está sendo vivenciada. A escuridão proporciona um ambiente acolhedor para podermos expressar nosso "eu", e é o momento em que somos tomados por questionamentos e por um desejo de pacificação do espírito. É, por assim dizer, o momento em que nos identificamos como seres humanos, pois é o instante em que as sombras e dúvidas da razão estão estampadas no ambiente externo a nós, algo como um espelho do andamento de nossa alma.

A arte faz mais sentido a noite, assim como as luzes e todas as construções humanas. Percebemos a enormidade da humanidade andando de mãos dadas com os seus aspectos mais animalescos e imundos. Isso tudo circula pela sombra da noite, disponível para o observador atento.

Nada é mais gratificante do que observar o anoitecer de uma cidade movimentada marchando frente aos seus sentidos: o aparecimento das luzes, a pressa das pessoas, os risos, o cansaço, os questionamentos, a alegria e as vozes. Enfim, a vida.

Todo anoitecer representa o renascimento da natureza humana.

Nenhum comentário: